LEISHMANIOSE AVANÇA EM DIREÇÃO À CAPITAL PAULISTA E IMPACTO “PODE SER GIGANTESCO”, DIZ PESQUISA

Doença vem “rondando” São Paulo (SP) com diagnósticos em cidades próximas à região metropolitana
Estudo publicado recentemente em importante revista científica europeia mostra que a leishmaniose visceral avança em direção a São Paulo (SP), com cães contaminados e pessoas diagnosticadas com a doença em cidades próximas à região metropolitana.
A doença provocada por um parasita (Leishmania infantum) e transmitida pelo mosquito-palha (flebotomíneo Lutzomya longipalpis) tem como principal reservatório o cão doméstico e o homem como hospedeiro definitivo.
O avanço ao longo dos anos tem acontecido a partir do oeste paulista, que tem Presidente Prudente como sede de região administrativa. A região faz divisa com Mato Grosso do Sul – porta de entrada do parasita, que veio da Bolívia.
O Brasil, juntamente com a Etiópia, o Quênia e o Sudão, concentra cerca de 60% dos casos em nível global, de acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). A leishmaniose visceral (LV) é uma doença tropical negligenciada.
Sua distribuição ocorre em escala global, estando presente em 76 países, sendo endêmica em 12 países das Américas. O Brasil é o país com maior número de casos na região sul-americana, representando cerca de 97% do total de casos.
Métodos geoespaciais
Com abordagem One Health (Saúde Única), o estudo analisou a distribuição espacial da LV utilizando métodos geoespaciais integrados; e a tendência temporal da LV para avaliar o impacto da pandemia de Covid-19 na ocorrência de casos.
Também utilizou, como parte dos objetivos, tecnologias geoespaciais para identificar municípios com maior vulnerabilidade para priorizar os esforços de vigilância e controle da LV no estado de São Paulo.
Desde 1999 (quando foram registrados os primeiros casos no estado de São Paulo) até 2022, o vetor Lutzomyia longipalpis foi detectado em 32,4% dos municípios, com cães portadores da doença em 29,0% e indivíduos infectados em 18,0%.
A região oeste, caracterizada por geomorfologia de planalto, desmatamento elevado e temperaturas mais elevadas, foi responsável por 30,6% dos municípios considerados de alto risco para leishmaniose visceral, reforçando a região como status prioritário para controle e vigilância.
O estudo conclui que há redução progressiva de novos casos de indivíduos infectados ao longo dos anos, porém a letalidade está aumentando. Embora os casos tenham permanecido estáveis durante a pandemia de Covid, as taxas de letalidade aumentaram.
Vigilância e intervenções
Embora o número de casos de Leishmaniose Visceral Humana (LVH) no estado de São Paulo tenha diminuído ao longo do tempo, o surgimento contínuo de casos em novos municípios ressalta a disseminação espacial contínua da doença.
O que implica na necessidade de vigilância persistente e intervenções direcionadas a ações efetivas de saúde pública. A análise espacial revelou disseminação contínua do flebotomíneo Lutzomyia longipalpis, o reservatório da Leishmaniose Visceral Canina.
O mesmo tem acontecido com o hospedeiro definitivo, isto é, indivíduos infectados
(LVH) da região oeste para leste em direção à área metropolitana de São Paulo, tendo as rodovias como pano de fundo para a dispersão do vetor, cães infectados e pessoas.
A rota principal é a rodovia Marechal Rondon, que em seus 558 km corta 36 municípios: de Castilho, na divisa com Três Lagoas (MS) com Itu, a 93,8 km de São Paulo.
A progressão está intimamente ligada a fatores ambientais, como temperaturas mais altas e desmatamento, ressaltando o papel significativo das mudanças climáticas na formação da dinâmica de transmissão da LV.
Aumento de letalidade
A região oeste de São Paulo foi identificada como área crítica, com clusters (agrupamentos) de alto risco e que exigem atenção prioritária para medidas intensificadas de vigilância e controle.
“Embora o número total de casos de LV tenha diminuído, o aumento das taxas de letalidade continua sendo uma preocupação significativa”, explica o médico infectologista, Dr. Luiz Euribel Prestes Carneiro, orientador do estudo.
“O controle eficaz da LV exige uma abordagem multidisciplinar de Saúde Única que integre as perspectivas de saúde humana, animal e ambiental”, pontua para dizer que os desafios de enfrentamento requerem colaboração intersetorial.
Portanto, vai além do setor de saúde tradicional. “Esses esforços são vitais para melhorar os resultados clínicos e promover estratégias de controle sustentáveis para a LV nos próximos anos”, afirma.
O estudo foi produzido em contribuição interinstitucional e fez parte da dissertação do médico infectologista Rodrigo Sala Ferro, no mestrado ofertado pelo Programa de Pós-graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional (PPGMadre), da Unoeste.
Áreas prioritárias
Rodrigo e Luiz Euribel são professores na Faculdade de Medicina de Presidente Prudente (Famepp/Unoeste), sendo que o Dr. Euribel também leciona e conduz pesquisas no PPGMadre e no Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde.
Dissertação de mestrado do infectologista Rodrigo Sala Ferro, do Programa de Pos-graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional da Unoeste (PPGMadre) e professor da Famepp.
O estudo tem o título “Tecnologias geoespaciais para identificar áreas prioritárias para vigilância e controle da leishmaniose visceral no estado de São Paulo, Brasil: adotando uma abordagem integrativa de Saúde Única”.
As instituições envolvidas são a Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) Unesp, por meio do Departamento de Estatística; e Instituto Adolfo Lutz, por intermédio do Centro de Parasitologia e Micologia.
Tem ainda a Secretaria Estadual de Saúde, pelo Instituto Pasteur, por meio da Coordenação de Controle de Doenças; e pelo o Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac, vinculado à mesma secretaria.
Demais autores do artigo: o médico Felipe Leonardo Semensati e os doutores Elivelton da Silva Fonseca, Rogério Giuffrida, Edilson Ferreira Flores, Roberto Mitsuyoshi Hiramoto, Osias Rangel, Silvia Silva de Oliveira Altieri e Rosana Leal do Prado.