CHEGADA DA LINHA 20-ROSA DO METRÔ E DESAPROPRIAÇÕES DE IMÓVEIS NO GRANDE ABC: ENTREVISTA COM ADVOGADO CESAR CHAIM

CHEGADA DA LINHA 20-ROSA DO METRÔ E DESAPROPRIAÇÕES DE IMÓVEIS NO GRANDE ABC: ENTREVISTA COM ADVOGADO CESAR CHAIM

Com a construção da Linha 20-Rosa, que ligará a Capital ao Grande ABC, é esperado que ocorram desapropriações de imóveis nas áreas necessárias para a construção de estações, linhas, saídas de ar etc. Para entender melhor sobre esse processo, conversamos com Cesar Chaim, advogado, morador do bairro Rudge Ramos por mais de 25 anos e sócio do escritório de advocacia Flávio Yunes Elias Fraiha Sociedade de Advogados, especializado em ações de desapropriação há 18 anos e referência na área de desapropriação atuando em favor dos proprietários.

Vamos começar do básico, o que é a desapropriação e quem tem o poder de desapropriar um imóvel?
A desapropriação é um ato de império do Poder Público pelo qual a União, os Estados ou os Municípios podem declarar determinados imóveis de utilidade pública para construção de metrô, escolas, hospitais, creches, alargamento de ruas etc. ou de interesse social para implantação, por exemplo, de habitação de baixa renda (HIS, CDHU ou COHAB). Em contrapartida, o proprietário tem o direito constitucional de receber uma indenização que seja justa (o imóvel deve ser indenizado com base no valor de mercado), prévia (primeiro o proprietário deve ser indenizado e depois entrega a posse do seu imóvel) e em dinheiro.
A tarefa de desapropriar pode ser transferida pela União, os Estados ou os Municípios à órgão da administração pública indireta como será nesse caso da Linha 20-Rosa. Isso porque após a finalização dos estudos e projetos, o Governador do Estado de São Paulo irá declarar de utilidade pública os imóveis que serão desapropriados para construção da Linha 20-Rosa e delegará a tarefa de promover as desapropriações ao Metrô de São Paulo ou Concessionária.

É possível a desapropriação parcial de um imóvel? Em caso positivo, como funciona o processo e pode nos dar um exemplo de como isso é feito?
Sim, é possível a desapropriação total ou parcial de qualquer imóvel. Em São Bernardo do Campo nós temos vários casos de desapropriações parciais, como por exemplo as desapropriações que ocorreram na Av. Newton Monteiro de Andrade, Vila Duzzi, atingindo imóveis de maneira parcial e total, para implantação do Corredor Leste/Oeste que faz parte do Programa de Transporte Urbano de São Bernardo do Campo – PTUSBC.
Tanto na desapropriação total quanto na parcial, o proprietário deverá ser indenizado pela área atingida, ou seja, terreno (valor de metro quadrado) e benfeitorias (valor da área construída). No entanto, quando se trata de desapropriação parcial deve ser feito uma análise técnica de engenharia para verificar se a construção que será atingida poderá ou não ser readequada, caso atinja alguma coluna estrutural do imóvel. Neste caso, apesar da desapropriação ser parcial o proprietário deverá ser indenizado por toda a benfeitoria.
Outro ponto na desapropriação parcial é verificar qual será o aproveitamento econômico que o proprietário terá com a área remanescente. Exemplo: eu tenho um imóvel de 500m², com 3 vagas de garagem, alugo para uma empresa e agora o Metrô irá desapropriar parcialmente 350m². Provavelmente, eu perderei a minha locação e o que farei com um Imóvel de 150m² sem vaga de garagem? Neste caso, o advogado deverá defender que a desapropriação deverá ser estendida para a área total do imóvel, pois a área remanescente perderá a sua vocação econômica.
Noutro giro, caso a desapropriação parcial não torne a área remanescente inaproveitável não impossibilitará o proprietário de pleitear indenização pela desvalorização da área remanescente. Exemplo: eu tenho um imóvel de 2.000m², estava negociando de vender para uma construtora e o Metrô resolve desapropriar parcialmente 1.200m². Nesse caso é difícil sustentar que uma área de 800m² ficará inaproveitável, porém eu posso pleitear indenização pela desvalorização da área remanescente porque agora o meu imóvel ficou inviável para a construção de um empreendimento.

Como a desapropriação de um imóvel locado deve ser conduzida? Existe diferença entre desapropriação de imóvel residencial e comercial?
Recomendo que o proprietário contrate desde o início do decreto de desapropriação advogado ou escritório de advocacia especializado em ações de desapropriação para que seja acompanhado todo o passo a passo do processo administrativo até se tornar uma ação judicial. Esse acompanhamento é importante para deixar o proprietário e o inquilino informados sobre tudo o que está acontecendo, a previsão de prazos para a desapropriação se efetivar e as obras iniciarem. Essa condução previne que o inquilino, de maneira precipitada, rescinda locação e o proprietário deixe de receber essa renda.
O procedimento da desapropriação não muda pelo fato do imóvel ser residencial ou comercial porque o poder público indeniza o valor do imóvel desapropriado (terreno e benfeitorias). A diferença é que se o imóvel for comercial a inquilina (empresa) poderá pleitear indenização contra o Poder Público Expropriante pela perda do fundo de comércio naquele local. Importante destacar que a jurisprudência prevê que a empresa deverá ajuizar uma ação autônoma contra o Poder Público, ou seja, na ação de desapropriação só se discute o valor de indenização que o proprietário receberá pela perda do seu imóvel. Somente será possível discutir a indenização do imóvel e a indenização pela perda do fundo de comércio se a empresa que exerce atividade econômica no local também for a proprietária do imóvel desapropriado.

Pode nos descrever as diferentes fases do processo de desapropriação e quanto tempo dura em média?
A legislação que regulamenta o procedimento da desapropriação é o Decreto-Lei n. 3.365 de 1941. Como o decreto tem mais de oito décadas, a maioria dos seus artigos foram revogados ou alterados, em razão disso é fundamental que o proprietário de um imóvel desapropriado contrate advogado ou escritório de advocacia especializado em ações de desapropriação, pois o que predominantemente rege a matéria hoje é a doutrina e a jurisprudência dos Tribunais Estaduais e Superiores (STJ e STF).
Basicamente, a desapropriação se divide em duas fases: a administrativa e a judicial. Hoje, a Linha 20-Rosa está em fase administrativa que consiste em estudos, projetos, licenciamentos ambientais, levantamentos topográficos, vistorias, elaboração de laudos administrativos, licitações para contratação de empresas para desenvolver e executar os projetos e, principalmente, a declaração de utilidade pública dos imóveis, ou seja, o decreto estadual do Governador do Estado de São Paulo autorizando a desapropriação dos imóveis para implantação da Linha 20-Rosa do Metrô.
Em relação a prazo, a contar da data da publicação do decreto de desapropriação no Diário Oficial do Estado de São Paulo, o Metrô terá 5 (cinco) anos para fazer acordos administrativos com os proprietários dos imóveis atingidos ou ajuizar perante o Poder Judiciário as ações de desapropriação. Caso isso não ocorra dentro desse prazo, o decreto de desapropriação caducará, ou seja, perderá a sua validade e o Governo do Estado de São Paulo deverá aguardar pelo menos 1 (um) ano para declarar novamente de utilidade pública os imóveis atingidos.
Para os moradores do ABC que acompanham essa antiga promessa, o exposto acima ocorreu com o último decreto de desapropriação do Governo do Estado de São Paulo, declarado pelo ex-governador Geraldo Alckmin.

Em média, quanto tempo leva para concluir um processo de desapropriação?
É inegável que a desapropriação está muito ligada a política. Isso porque para a obra pública sair do papel depende da vontade do Gestor Público (Governador ou Prefeito) e este ter no orçamento a verba pública para execução da obra.
Pela minha experiência em ações de desapropriação em mais de uma década, nos últimos 5 anos tenho visto que os projetos e decretos de desapropriação, principalmente do Metrô, saíram do papel e foram executados de maneira muito rápida, pois o Metrô possui um corpo técnico e jurídico muito qualificado, sem falar que como se trata de uma empresa pública com patrimônio próprio é bem menos burocrático a disponibilização de recursos, como ocorre com Prefeituras, por exemplo.
A título exemplificativo, o Metrô, por meio do decreto de desapropriação nº 63.618 de 1º de agosto de 2018, desapropriou diversos imóveis em dois quarteirões na Av. Prof. Luiz Ignácio Anhaia Mello (ao lado da estação Vila Prudente), São Paulo, para implantação do Track Switch. No início de 2020, ou seja, em menos de um ano e meio as desapropriações foram ajuizadas, os proprietários indenizados e o Metrô começou as obras.

Quem faz a avaliação do Imóvel desapropriado? Quem é o responsável por arcar com os custos da perícia no processo de desapropriação?
O Poder Público, em regra, oferece ao proprietário um valor muito abaixo de mercado, o que dá ensejo ao ajuizamento da ação de desapropriação perante o Poder Judiciário.
Com o ajuizamento da ação de desapropriação, o juiz nomeia um Perito Judicial de sua confiança para avaliar o Imóvel expropriado. Esse profissional deverá avaliar o Imóvel com base no valor de mercado do bem na região que está inserido e considerar todas as suas características físicas (benfeitorias), valorativas e depreciativas.

Por força do art. 95 do Código de Processo Civil, como o Poder Público Expropriante deu causa ao ajuizamento da ação de desapropriação será também o responsável pelo pagamento dos honorários do Perito Judicial nomeado pelo juiz.
Destaca-se que na ação de desapropriação, tanto o proprietário do Imóvel quanto o Poder Público Expropriante deverão indicar, além de Advogados, Assistentes Técnicos especializados em avaliações imobiliárias no âmbito da ação de desapropriação e que dominem as Normas Técnicas de Avaliações e Perícias Judiciais.

Como é realizado o pagamento pelo Poder Público pela indenização do Imóvel desapropriado? O valor é pago em juízo? Quem pode receber o valor da Indenização? É possível o Poder Público parcelar o pagamento?
O inciso XXIV do art. 5º da Constituição Federal prevê que a indenização na ação de desapropriação deve ser justa (o imóvel deve ser indenizado com base no valor de mercado), prévia (primeiro o proprietário deve ser indenizado e depois entrega a posse do seu imóvel) e em dinheiro.
Se o Poder Público fizer acordo administrativo com o proprietário, o valor será pago no ato da assinatura da Escritura Pública de Desapropriação Amigável. O procedimento é similar ao da venda e compra de um imóvel.
Não havendo acordo administrativo o Poder Público ajuizará a ação de desapropriação. Na primeira decisão do processo, o juiz nomeará um Perito Judicial de sua confiança para avaliar o Imóvel expropriado e apresentar o primeiro laudo judicial, denominado Laudo Prévio. De imediato, o advogado ou escritório de advocacia especializado em ações de desapropriação deverá apresentar defesa e acompanhar a avaliação prévia. Este é o momento mais importante do processo, pois será com base neste primeiro laudo que o proprietário perderá a passe do seu imóvel e receberá 80% da indenização em dinheiro.
Caso o Poder Público queira entrar na posse do Imóvel logo no início do processo deverá depositar em juízo, ou seja, na conta judicial perante o Banco do Brasil vinculada ao processo 100% do valor apurado pelo Perito Judicial em Laudo Prévio.
Em contrapartida, o proprietário poderá receber, neste momento, 80% da indenização mediante o cumprimento dos requisitos do art. 34 do decreto de desapropriação, quais sejam: (i) matrícula imobiliária atualizada provando que ela é a proprietária do imóvel; (ii) certidão negativa de débitos fiscais, ou seja, não pode ter dívidas de IPTU ou ITR; e (iii) edital para conhecimento de terceiros.
Somente é autorizado o recebimento de valores mediante ordem judicial. O Poder Judiciário exige que o compromissário comprador (contrato particular de venda e compra quitado) lavre a escritura pública de venda e compra e registre na matrícula do Imóvel, assim como os herdeiros devem regularizar os inventários e registrar na matrícula do Imóvel para que recebam o valor da indenização.
Posteriormente, o Perito Judicial será intimado para apresentar o Laudo Definitivo. As partes (Poder Público e Expropriado) apresentarão quesitos e críticas ao laudo. O Perito Judicial será intimado a responder e poderá: (i) manter o valor apurado inicialmente em Laudo Prévio; (ii) acolher a crítica do Poder Público e diminuir o valor da indenização. Por isso, que são levantados apenas 80% e os 20% fazem frente a eventual diminuição; ou (iii) acolher a crítica do proprietário e aumentar o valor da indenização. Caso o juiz acolha o aumento em sentença e seja mantido pelo Tribunal, ao final do processo o proprietário receberá os 20% da indenização depositada e executará o Poder Público a pagar os valores que não estiverem depositados em juízo.
O Metrô por ser uma empresa pública indeniza sempre os proprietários em dinheiro, ou seja, não há pagamento de precatório, como pode ocorrer – a depender do caso – quando o Poder Público Expropriante for uma Prefeitura, por exemplo.
Em relação ao parcelamento do pagamento da indenização pelo Poder Público, eu não recomendo que o proprietário aceite o parcelamento ainda mais se for de uma Prefeitura ou Governo, pois não são raros os casos no judiciário em que determinada Prefeitura parcela o pagamento em 10 prestações, recebe a posse do imóvel desapropriado, paga 2 parcelas e deixa de pagar as demais, restando ao proprietário executar judicialmente o pagamento, o que pode levar anos ou quiçá décadas. Todavia, o proprietário tem que ponderar o valor envolvido, necessidades e eventuais riscos.

Existe algum imposto a ser pago sobre o valor recebido de indenização?
Não. Nos termos do § 2º do art. 27 do Decreto-Lei nº 3.365/41, considerando a natureza indenizatória dos valores recebidos pelos proprietários na ação de desapropriação, não incidem quaisquer impostos, principalmente ganho de capital ou lucro imobiliário.

Existe alguma proteção legal para o proprietário do imóvel em caso de desapropriação indevida ou injusta? Quem ele pode acionar o Ministério público?
Nós temos um processo legal que tem como objetivo deixar a indenização pela perda do imóvel mais justa possível, no entanto, o que minimiza eventual injustiça é o proprietário nomear um advogado ou escritório de advocacia especializado em ações de desapropriação.
O que torna injusto ou ilegal muitas das vezes é o fato de o Poder Público não honrar com o pagamento do parcelamento da indenização como expliquei anteriormente ou entrar na posse do imóvel do proprietário sem observar o devido processo de desapropriação. Não é a regra, mas existem exceções junto ao Poder Judiciário. Se isso ocorrer, o proprietário deverá ajuizar uma ação indenizatória em face do Poder Público, chamada desapropriação indireta.
Por isso, sempre destaco para os proprietários de imóveis desapropriados que o principal trunfo que o proprietário tem é a posse do seu Imóvel.

Site do Dr César http://www.fyfadv.com.br/

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